sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

ÂNSIA ANÁLOGA A ÂNSIA




 
PSICOLOGIA DE UM VENCIDO


Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
 
Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
 
Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
 
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
 
by Augusto dos Anjos

27 comentários:

  1. Acróstico

    Acabrunhado pelo evento da morte
    Augusto desanca aquela ceifadeira
    Umbroso, faz soneto a sua maneira
    Garimpando as rimas de sul a norte.

    Ulceroso se antevê debaixo da terra
    Sente-se comido no mergulho final
    Talvez para os vermes mero mingau
    Onde sua vida portanto se encerra.

    Deixa em versos registrada a ânsia
    Ou talvez suas palavras derradeiras
    Sabe da morte queira ou não queira
    Assusta-se porém da circunstância.

    Nada de bom nessa morte o espera
    Já que ir-se quase ninguém gostaria
    Ou falar desse evento será grosseria
    Se sempiterno estar é uma quimera.

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    1. Bravo, meu caro poeta e amigo Jair...não me acostumo a tua verve, teu riquíssimo vocabulário, como o mestre que trago ao blog, poeta este que sempre, desde que o conheci, faz parte da minha existência e de como, muitas vezes sou os poemas do Augusto dos Anjos, ainda hoje. Sobre a morte ? está aí meu tema favorito, e mesmo que não fosse, me persegue, como se acabasse sempre em morte, tudo. Acho que é isso. Obrigado meu amigo por mais este tão bem desenhado acróstico e entregue aqui no meu blog, aumentando meu teseou de comentários. Carinho respeito e abraço.

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  2. Amigo Jair Machado, a primeira vez e adentrei no livro "Eu" do Augusto dos Anjos, fui acometido de arrepios e angústia...
    Grande réplica acróstica do nosso amigo, grande poeta Jair Lopes.
    Um abração Tenhas um ótimo fim de semana.

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    1. Verdade meu querido amigo e poeta Dilmar, sou fascínado por A. dos Anjos, e mais verdade ainda é o poder das palavras de nosso amigo Jair. Tenho muita sorte, olha o naípe dos amigos visitantes, como tu meu rocio amigo Dilmar.
      ps.; Carinho respeito e abraço.

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  3. Angustiante este poema de Augusto dos Anjos ... mas lírico e realístico ... Belíssimo ...

    Beijão amigo ...

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    1. Acho que me alimento de angústia também, meu rei, por isso gosto tanto deste poeta, gosto do lírico (acho uma bela palavra), mas usei mais foi o lado realístico dele, "este ambiente me causa repugnância", como a imagem do portão de Auschwitz. De alguma forma a dor contida nos poemas do Augusto dos Anjos se entranhou em mim ao ver uma série de reportagens sobre os 70 anos do Holocausto nazista, e juntando mais minha dor natural rs, não consegui escrever algo, aliás tou num bloqueio, mas preciso me expressar, enfim...meu rei, meu amigo querido Bratz, mas não há angústia quando te recebo aqui, então sou só alegria, iluminado por tua presença. Carinho respeito e abraço.

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  4. Olá,Boa tarde,Jair
    Esse poema do A.Cury foi/é um prato cheio de análise para quem presta ou estuda para vestibular, com os termos “antipoéticos” como amoníaco, epigênese , verme , carbono e a depreciação de si mesmo , o filho da matéria no seu sentido mais simples com a sua visão fria da morte e a angústia diante da decomposição fatal do corpo humano.
    ... li pouco Jorge Luis Borges, Aleph, e nessa obra , o real confundia-se com a realidade,sugeridas por imagens e espelhos...sim, se a vida em si, "letradamente" não é interessante - há exceções à regra - é desafiador transformar essa realidade /vida em algo que encante e não apenas informe .
    ... "costumo estar entre a ficção e o que sou e o que sinto, mesmo na ficção sou eu ou não"- Inventadas,vivenciadas ou catártica, a obra quase sempre estará ao nível do autor,somente que se carregar várias construções fictícias, metáforas etc etc , o "eu" não será puro em sua essência... É assim que eu penso!
    Não costumo responder os meus comentários LÁ, no meu blog ,eu prefiro fazer quando de minhas retribuições okei?
    Obrigado pelo carinho,belos dias, abraços!

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    1. Nossa Felisberto, sempre tive o maior respeito por tuas postagens, por ti, sempre o achei inteligente, interessante, elegante e carinhoso nos comentários, mas tu é mais que isso, és um estudioso, um conhecedor de literatura...interpreta Augusto dos Anjos como ninguém, o cara era gênio né ? lá naqueles rincões obscuros da arte dos séculos passados, surge um ser iluminado na escuridão, com as palavras certas e estranhas, mas todas ali, só esperando para serem usadas,e ele o fez.
      “Não criei personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém, não expresso minhas emoções diretamente, mas por meio de fábulas e símbolos. Nunca fiz confissões. Mas cada página que escrevi teve origem em minha emoção".
      Jorge Luis Borges
      Não ficou muito claro minha interpretação deste pequeno trecho atribuído a ele, de onde recriei esta minha maneira de ver e escrever e...foi o que comentei no teu post lá no teu blog.
      “o "eu" não será puro em sua essência...” acredito nisso, parecendo meio confuso e contraditório agora ? Pois é Felisberto, estou tentando fazer um caminho, o meu caminho, mas não possuo a capacidade de seguir nas minhas próprias fracas pernas rs...então pode ocorrer de eu pegar e agregar aos meus valores e me dar a ilusão de criar algo, mas sei das influencias...mas consigo captar que buscas tua essência, mais pura e verdadeira, e tens razão nisso. Acho que são os processos criativos, acho que só consigo assim. Gosto tanto de 'belos dias” é como me desejasse a felicidade eterna, obrigado.
      Meu querido Felisberto, muito feliz com teu riquíssimo comentário e tua nobre presença neste pequeno blog. Carinho respeito e abraço.

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    1. DO QUE NADA SE SABE

      A lua ignora que é tranquila e clara
      E não pode sequer saber que é lua;
      A areia, que é a areia. Não há uma
      Coisa que saiba que sua forma é rara.
      As peças de marfim são tão alheias
      Ao abstracto xadrez como essa mão
      Que as rege. Talvez o destino humano,
      Breve alegria e longas odisseias,
      Seja instrumento de Outro. Ignoramos;
      Dar-lhe o nome de Deus não nos conforta.
      Em vão também o medo, a angústia, a absorta
      E truncada oração que iniciamos.
      Que arco terá então lançado a seta
      Que eu sou? Que cume pode ser a meta?

      Jorge Luis Borges, in "A Rosa Profunda

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    1. Meu prof.Elian, meu querido amigo...eu tento pegar pesado, mas sou tão fraquinho rs. Não tem como ficar indiferente a umpoema do Augusto dos Anjos. Sempre muito bom estar contigo, estar conectado . Todo meu carinhomeu respeito e meu abraço.

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  7. Profundo y lleno de impacto.
    Magnífico Acróstico.
    Abraço.

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    1. Gracias meu amigo Pedro por especial visita...é maravilhoso visitar alguém e encontrar outro alguém inesoperado...então delicie-se com o acr´sotico domeu amigo Jair, meu xará, vai noblog dele então tu verás o que é magnífico .Carinho respeito e abraço.

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  8. Bom dia, Jair, o comentário do Felisberto está completíssimo, pois o Augusto dos Anjos é um dos mais importantes poetas do Pré Modernismo.Gosto de suas obras por ser muito crítico.Parabéns , pela rica postagem. Grande abraço!

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    1. Olá querida Marli, sempre muito bom contar com tua querida presença...então, este menino é uma benção do saber, eu ficomaravilhado poder conectar com pessoas tão especiais, tão inteligentes, e eu só ganho com isso, eu aprendo. A obra dele é tão instigante, é tão pré moderna, tão moderna, tãopós moderna...Obrigado, a riquesa da postagem tá nas pessoas que vieram, então é um post muito rico, tu estás aqui. Carinho respeito e abraço.

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  9. Augusto dos Anjos me lembrou as antigas aulas de literatura do colégio...

    me deu saudade agora.

    beijo
    beinghellz.blogspot.com

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    1. Minha adorada menina Hellz, tou sem net para poder navegar no teu blog, que sabes que gosto muito...lembro de decorar uns poemas dele na época do colégio (lá se vai muito, muito tempo rs). Amo também Versos Íntimos:
      "Vês! Ninguém assistiu ao formidável
      Enterro de tua última quimera.
      Somente a Ingratidão - esta pantera -
      Foi tua companheira inseparável!


      Acostuma-te à lama que te espera!
      O Homem, que, nesta terra miserável,
      Mora, entre feras, sente inevitável
      Necessidade de também ser fera.


      Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
      O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
      A mão que afaga é a mesma que apedreja.


      Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
      Apedreja essa mão vil que te afaga,
      Escarra nessa boca que te beija!"

      Menina Hellz, meu carinho meu respeito e meu abraço.

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  10. Si hermano, hijos del carbono....a mucho honor!
    Lindas tus letras
    Paz
    Isaac

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    1. "Pero el amor,
      el amor es real,
      lo único real,
      el amor más allá de toda ilusión..."
      Meu caro Isaac, gracias pela presença, gracias pelo nome do blog, eu gosto muito...o poema postado é de um poeta imortal da Literatura Brasileira, ele conseguiu transcrever o horror em poesia, bem moderna para a época, e causa estranhamento até os dias de hoje. Mas só amor importa, só o amor é real e a fé, caso contrário acabariam logo os motivos que nos prendem, ou me prendem aqui na Terra. Feliz demais com tua honrosa visita. Carinho respeito e abraço.

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  11. Tão bom saber que muitos apreciam Augusto dos Anjos, em tempos de redes sociais e suas banalidades, nada melhor que encontrar uma postagem tão preciosa como essa. Parabéns Jair!

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    1. Querida Néia, também acho uma grata surpresa e nem tanta surpresa, pois as pessoas que veem aqui são tão especiais e cheias de conhecimento, o que me facilita rs...pois é Néia, já nem sei o que é banalidade, embora as redes sociais se ocupem bastante com situações fúteis – é fato, mas a vida esta banalizada, morremos toda hora por nada,não paramos para apreciar um poema de Augusto dos Anjos, mas ocupamos bastante tempo na internet para falar mal de alguém, que por vezes nem conhecemos, enfim...o bom é que existimos, somos do bem e queremos o bem do próximo. Sempre palavras suaves e de paz veem de ti querida amiga Néia, obrigado. Carinho respeito e abraço.

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  12. O Augusto dos Anjos era tão triste,né,sempre que leio algo dele sinto uma brisa fria no rosto,acho que ele resume bem alguns momentos de vida q todos passamos, esse tipo de poema é sempre atual...

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    1. Poderosa Madi, quanto prazer, que felicidade em tê-la novamente, agora com um olhar biônico rs...estava com saudade minha querida amiga, te vi lá no Bratz, mas vou lá no teu blog...eu mórbido que sou rs, amo Augusto dos Anjos, e é muito atual esta dor que sentimos, que nos fazem sentir, basta ver um telejornal...gosto desta sensação que dizes sentir ao lê-lo, uma brisa fria, algo dolorido, mas tão verdadeiro e poético...a tristeza alimenta minha criação literária (acho meio horrível isso, mas acho que escrevo melhor triste - acho que o sentimento aflora mais viceral, enfim)...mas agora ésó alegria,com tua charmosa visita. Carinho respeito e abraço.

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  13. Boa noite, Jair.
    Adorei a escolha.
    Muitos pensam que poemas são feitos somente de alegrias, só que isso não é possível, uma vez que a vida é dual e é nisso que eu me apego.
    Momento, fases de dor, depressão como um estado, todos passaremos, mas podemos vencer e deixar sobressair o lado mais feliz de nossas almas.
    Tenha uma semana de paz.
    Agradeço demais o seu carinho em comentário no blog do Hélder Gonçalves, onde está a minha poesia.
    Faço-te o convite para conhecer o meu blog pessoal e deixar seu comentário por lá.
    Já te seguindo.
    Beijos na alma e linda semana.

    http://redescobrindoaalma.blogspot.com.br/

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    1. Olá cara poeta Patrícia, obrigado pela nobre visita e adorável e certeiro comentário. Sempre digo que a poesia põe beleza na dor....Obrigado, eu também estou te seguindo, conheci teu blog e amei, estarei porlá. Carinho respeito e abraço.

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