segunda-feira, 23 de outubro de 2017

INTROSPECTOJAIR

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50 anos é sim uma boa medida para metade da vida. Hoje quantas pessoas chegam aos 100 anos ? Poucas. Raras. Então estou a passos largos para a morte. Não é pessimismo, é constatação. É fato. E quem foi que falou na melhor idade ? Só se for pra morrer. Mas não posso deixar de constatar meu amadurecimento, que está por um tris com este post. Hoje sei bem o que me satisfaz, e o que não tenho e que não terei nesta passagem in albis pela Terra. Os sonhos guardo todas as manhãs, quando acordo, numa caixinha que vai para o fundo do baú, onde poderei encontrar o silêncio e o isolamento. Distante das tentações da vida e da vida em si. Porque me expor ao Sol, se vou derreter, ou à Lua se posso sair uivando como um lobo. Só sei que nada sei, disse uma vez o filósofo, e eu repito para minha alma, que nada sabe. É o peso do tempo e da idade, que me concedem a maturidade necessária para viver entre os demais, sem que haja atrito, sem que haja morte ou tristeza. Nestes 50 anos não vivi um amor verdadeiro, pois continuo em meu casulo, me protegendo, dos ventos, da sorte e do azar...me protegendo dos olhos que um dia eu me vi através deles e agora é só uma lembrança distante, perdida. Fechado em meu mundo de livros, músicas e silêncios. Não ouço meus passos, flutuo sobre os cacos de louça esparramados por minha cozinha, e não vejo o pão que mofa sobre a mesa, mas vejo a violeta que fica na janela, me olhando e perdendo sua cor, se deixando sugar pelo tempo, pelo calor, pelo desejo de ter cor outra vez...mas depois dos 50 anos começamos a desbotar, a ter pressão alta e operações, deixando cicatrizes pelo corpo imaculado, agora jogado ao tempo para cumprir seu destino, o que resta dele...


"Que venham os anos.
Pretendo comê-los com sabedoria e um pouco de vitamina E."

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

ENTÃO QUERES SER UM ESCRITOR

se não sai de ti a explodir
apesar de tudo,
não o faças.
a menos que saia sem perguntar do teu
coração, da tua cabeça, da tua boca
das tuas entranhas,
não o faças.
se tens que estar horas sentado
a olhar para um ecrã de computador
ou curvado sobre a tua
máquina de escrever
procurando as palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes para teres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma e outra vez,
não o faças.
se dá trabalho só pensar em fazê-lo,
não o faças.
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.
se tens que esperar para que saia de ti
a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.
se tens que o ler primeiro à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou pais ou a quem quer que seja,
não estás preparado.
não sejas como muitos escritores,
não sejas como milhares de
pessoas que se consideram escritores,
não sejas chato nem aborrecido e
pedante, não te consumas com auto-devoção.
as bibliotecas de todo o mundo têm
bocejado até
adormecer
com os da tua espécie.
não sejas mais um.
não o faças.
a menos que saia da
tua alma como um míssil,
a menos que o estar parado
te leve à loucura ou
ao suicídio ou homicídio,
não o faças.
a menos que o sol dentro de ti
te queime as tripas,
não o faças.
quando chegar mesmo a altura,
e se foste escolhido,
vai acontecer
por si só e continuará a acontecer
até que tu morras ou morra em ti.
não há outra alternativa.
e nunca houve.



by Charles Bukowski

Tradução: Manuel A. Domingos

SEGUNDA CANÇÃO DE MUITO LONGE


Havia um corredor que fazia cotovelo:
Um mistério encanando com outro mistério, no escuro…
Mas vamos fechar os olhos
E pensar numa outra cousa…
Vamos ouvir o ruído cantado, o ruído arrastado das correntes no algibe,
Puxando a água fresca e profunda.
Havia no arco do algibe trepadeiras trêmulas.
Nós nos debruçávamos à borda, gritando os nomes uns dos outros,
E lá dentro as palavras ressoavam fortes, cavernosas como vozes de leões.
Nós éramos quatro, uma prima, dois negrinhos e eu.
Havia os azulejos, o muro do quintal, que limitava o mundo,
Uma paineira enorme e, sempre e cada vez mais, os grilos e as estrelas…
Havia todos os ruídos, todas as vozes daqueles tempos…
As lindas e absurdas cantigas, tia Tula ralhando os cachorros,
O chiar das chaleiras…
Onde andará agora o pince-nez da tia Tula
Que ela não achava nunca?
A pobre não chegou a terminar o Toutinegra do Moinho,
Que saía em folhetim no Correio do Povo!…
A última vez que a vi, ela ia dobrando aquele corredor escuro.
Ia encolhida, pequenininha, humilde. Seus passos não faziam ruído.
E ela nem se voltou para trás!

by Mário Quintana

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

SERÁ QUE SOU MEDIEVAL



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Segundo a evolução darwinista, o ser humano foi se transformando até chegar onde estamos, bípedes...mas algo está errado, ou continuamos em processo de transformação. Chegamos ao auge da civilização moderna, e me parece que estamos em franca decadência, porque o moderno está dando lugar às trevas, estamos retrocedendo, nas atitudes, nas opiniões, nos valores. O homem que iniciou quadrupede, agora bídepe está começando uma nova era, a era digital, então o homem está com a cabeça baixa, arcado, como se buscasse novamente o solo, retrocedendo até engatinhar novamente (com as tecnologias cada vez mais práticas, carregamos nas mãos) e ao contrário do que se pensa e quer, logo estaremos engatinhando, de volta ao passado. Introspectivo, a palavra que poderia me definir nestes tempos em que a luz da razão esta sendo invadida pelas trevas da ignorância. Um policiamento como tempos atrás, em que este país enfrentou uma ditadura militar. Pela moral e bons costumes, adentramos no mundo das trevas.   Me pergunto: será que sou medieval?

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CAZUZA














Medieval II



Você me pede pra eu ser mais moderno
Que culpa que eu tenho
É só você que eu quero

As vezes eu amo e construo castelos
As vezes eu amo tanto que tiro férias
E embarco num tour pro inferno

Será que eu sou Medieval?
Baby, eu me acho um cara tão atual
Na moda da nova idade média.
Na mídia da novidade média.

Olha pra mim, me dê a mão, depois um beijo
Em homenagem a toda distância e desejo
Mora em mim que eu deixo as portas sempre abertas
Onde ninguém vai te atirar as mãos vazias nem pedras

Eu acredito nas besteiras que eu leio no jornal
Eu acredito no meu lado português sentimental
Eu acredito em paixão e moinhos lindos,
Mas a minha vida sempre brinca comigo,
De porre em porre vai me desmentindo

Será que eu sou Medieval?
Baby, eu me acho um cara tão atual
Na moda da nova idade média.
Na mídia da novidade média.



by Cazuza


sexta-feira, 6 de outubro de 2017

TODA VEZ...


Resultado de imagem para SINTO PASSAR UM RAIO DE TRISTEZA








"Every time I think of you
I feel a shot right through into a bolt os blue"
Toda vez que penso em você...
...eu sinto passar por mim um raio de tristeza, que atinge apenas o caminho por onde ando, atraído por alguma árvore que se sacrifica por mim. Mesmo que eu chore, não conseguirei traze-la de volta à vida, como nunca terei em meus braços, apenas nesta memória difusa e perdendo-se com o tempo. Mesmo que os furacões levem casas, homens e memórias, mesmo que o chão se abra sob meus pés. Ouvir tua voz de indiferença acendeu meu alerta vermelho. Homens ao mar, crianças e mulheres. Há muito abandonei a embarcação, mesmo antes do final trágico deste destino, já andava `a deriva no meu inconsciente, este mar infinito dentro de mim. Densos ventos avançam mar a dentro, mar a fora, em todas as ilhas, em todo meu infinito inconsciente, que retira-se, como uma tartaruga se esconde no casco, como os cavalos marinhos que guardam dentro de si, os filhotes. Pensar e sonhar e escrever me faz um forte, com a resistência da esperança, embora toda vez que penso em você, sinto que o mundo treme abalado pela bomba H., quando explodir, exterminando seres vivos, violentando as crianças, chutando os animais...neste mesmo tempo começa a caçada as bruxas: o que devo ver, o que não devo ver...assim com as desculpas de moralidade, acham-se no direito de proibir exposição de arte, mesmo que na calada da noite, nossos políticos, que estão longe, muito longe da honestidade e decência, nos proibam de criticá-los, com leis aprovadas na indiferença do povo, mas que fortalece o que já está implantado, qual seja, ferrar quem trabalha honestamente "e agora não tem mais direito a nada..."*eu sinto, eu sinto muito pensar em ti e perceber que acabou há muito tempo, todo o amor que dediquei em vão, que se esgotou em si mesmo, secando meu coração. Toda vez...

"Why can't we be ourselves like we were yesterday" (Porque não podemos ser nós mesmos como fomos ontem). by New Order
*Legião Urbana