Cenário - um pequeno quarto, com uma cadeira de palha velha, uma cama velha, um pequeno bidê velho com uma lata velha de azeite servindo de vaso para uma rosa, esta sim bela e nova e vermelha, uma janela com as venezianas abertas e os vidros fechados, não é possível ver, mas há um cheiro de mofo. Sobre a cama enrolado num cobertor velho, um homem, que apesar de parecer velho, não é. Acorda. Fica alguns minutos olhando o teto na esperança de encontrar algo, que não sabe o que é, mas algo que o estimulasse alevantar, descer até a padaria e tomar um pequeno café com pão, e um pouco de manteiga, mas mal conseguiu levantar, cambaleante, não da ressaca, pois não bebia, mas do porre tomado no pesadelo que o atormentou a noite toda. Espreguiçou-se, então se pode ouvir o primeiro som saindo de sua boca, uma espécie de grunhido, cujos braços acompanhavam como num balé sem sentido, encaminha-se ao pequeno banheiro, fecha a porta e não se pode ver nada, depois de algum tempo ouve-se o barulho da descarga. Sai do banheiro.
- Se ao menos tivesse um cão, ele poderia sorrir para mim, abanar o rabo, lamber minhas pernas, latir para mim...quem sabe não me sentisse tão s´, tão sem ninguém, tão e.t., tão brasileiro, se bem que brasileiro nunca está só, ou é casado, ou tem amante, ou namorada, ou tem...(pensou), existem tantas formas formas de amar, como não consegui uma para mim, como não encontro ninguém que me olhe com algum interesse, além da repulsa de não ser o que gostaria de ver, de falar, de abraçar...(dá de ombros)mas tou acostumado com isto, minha vida toda. (Senta-se na cadeira velha de palha). Toda minha porcaria de vida, desde pequeno, aquele bando de irmãos, eu apesar de ser o caçula, era esquecido por todos, pai, mãe, irmãos, até os bichos...lembra do cachorro que gostaria de ter ? pois é, , os cuscos da casa, nenhum brincava comigo, no máximo , ladravam enraivecidos, claro, incitados pelos meus irmãos, que pelo visto me odiavam. Minha mãe nunca me deu peito, nem carinho, meu pai nunca me deu colo. Aprendi a caminhar me arrastando pelo chão. Esqueciam de mim na rua quando anoitecia e todos entravam para dentro de casa, e eu confundido com a lama ficava ali, mas não chorava, apenas ficava ali, sob luar, a única coisa bela que lembro da minha infância, a Lua. (Neste momento cai uma lágrima de seu olho, vlta-se parea a janela e o dia amanhece, só um rastro de luar e uma única estrela que brilha sem parar lá longe no firmamento - as luzes apagam-se).
ps. Obrigado Ivo Bender por esta inspiração teatral e matar um pouca a saudade que sinto do palco.