quarta-feira, 24 de outubro de 2018

VÉSPERAS


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Vésperas de eleição, confesso que ando meio alheio a tudo que remete a política. Estou alienado. Mas tudo é política. Seguindo o barco, ouço o murmulhar das ondas batendo no casco...desligo o torneira que lavava uma garrafa térmica, sim, térmica, uma das invenções destes tempos, já banalizada. Sem o barulho da água saindo da torneira, ouço o fervilhar de lava, de um vulcão, no árido nordeste, como se não bastasse a fome, a seca. É só a água fervendo, desligo o fogão, o gás...Eis que ouço ao longe, como se fosse uma infância perdida, há muito tempo. É um discurso inflamado, que ecoa na cozinha onde me encontro, vindo lá do fundo, de dentro, de um celular, de um casarão. Penso na infusão, gosto disso desde que vi num filme numa madrugada dessas de insônia. Na infusão, do chá que gostaria de fazer com ervas do campo, colhidas á pouco tempo por minhas mãos em um vasto jardim. Pisco, e estou lendo antes de abrir o pequeno pacote colorido de vermelho: chá de maçã. Meus ouvidos me levam a ver meu pai na cozinha ouvindo seu rádio, e preocupado com os colegas de trabalho no sindicato, devido a perseguição de ditadura que comandava o país naquele tempo. Eu, nem tão pequeno para entender, nem tão grande para sentir a atmosfera daqueles tempos de chumbo. Coloco o saxe na garrafa térmica, e continua o discurso de um candidato, não mais lá na minha infância, mas agora no meu mundo adulto de hoje. Peguei minha garrafa térmica e corro pelo corredor, de volta por onde vim, com um peso de angústia no peito. Não acredito nos meus ouvidos, como fantasmas em forma de memórias tristes, de dor e tortura, de morte e de vala coletiva de cadáveres. De pessoas que não apareceram até o dia de hoje. Corri pelo corredor, tranquei-me na sala e voltei, aos poucos, aos batimentos cardíacos normais, ainda não aconteceu. Vésperas de eleição...





ps.
Caríssimo amigo Xaverico, muito me alegra tua presença e comentário neste blog, obrigado. Este post traduz um pouco minha angústia. Adoro televisão, desde muito pequeno, tenho muitas memórias afetivas...concordo em gênero, número e grau com teu comentário. Vivemos tempos delicados, de fúria e paixões radicais. Sim, merecemos ser felizes...eu aqui agradecido com tua amizade virtual/de verdade e desejo que esta mesma felicidade que merecemos seja imensa na tua vida. Carinho respeito e abraço.




segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Já estou vendo TV como companhia


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LEVE DESESPERADO

Eu não consigo mais me concentrar
Eu vou tentar alguma coisa para melhorar
É importante, todos me dizem
Mas nada me acontece como eu queria

Estou perdido, sei que estou
Cego para assuntos banais
Problemas do cotidiano
Eu já não sei como resolver

Sob um leve desespero
Que me leva, que me leva daqui

Então é outra noite num bar
Um copo atrás do outro
Procuro trocados no meu bolso
Dá pra me arrumar um cigarro?

Eu não consigo mais me concentrar
Eu vou tentar alguma coisa para melhorar
Já estou vendo TV como companhia

Sob um leve desespero
Que me leva, que me leva daqui

Talvez se você entendesse
O que está acontecendo
Poderia me explicar
Eu não saio do meu canto
As paredes me impedem
Eu só queria me divertir

As paredes me impedem
Eu já estou vendo TV como companhia

Sob um leve desespero
Que me leva, que me leva daqui

Sob um leve desespero
Que me leva, que me leva daqui

by Capital Inicial


ps.
Por fora, bela viola, por dentro pão bolorento. Muito ouvi isso na minha infância, e até nos dias de hoje, está numa música da Pitty (que eu amo), inclusive. Assim me sinto, assim me apresento aos olhos dos que me cercam. Ocorre que não sou belo por fora, um pouco feio e por dentro não tenho bolor, mas dor, angústia, raiva, solidão, insatisfação com o que tenho e vivo. Seria tão simples, acabar com isto, com estes sentimentos e com minha feiura, mas falta-me coragem. Vou arrastando, me arrastando, tentando amar, tentando viver. Um grande palco é a vida e estou encenando minha felicidade, como se faz no facebook, onde se mostra a bela casca, enfim. Meu blog querido, os remédios me mantém assim, meio abobalhado para tudo, esquecido de minha dor...vou seguindo na escuridão dos montes, sonhando com penhascos, sonhando em voar para os céus, como um Ícaro louco, para o Sol derreter minhas asas, e eu cair nas profundezas da Terra. Mas me contento em ficar trancado em casa tendo a televisão como companhia...

 TUDO QUE VAI

Hoje é o dia
Eu quase posso tocar o silêncio
A casa vazia
Só as coisas que você não quis
Me fazem companhia
Eu fico à vontade com a sua ausência
Eu já me acostumei a esquecer

Tudo que vai
Deixa o gosto, deixa as fotos
Quanto tempo faz
Deixa os dedos, deixa a memória
Eu nem me lembro mais

Salas e quartos
Somem sem deixar vestígio
Seu rosto em pedaços
Misturado com o que não sobrou
Do que eu sentia
Eu lembro dos filmes que eu nunca vi
Passando sem parar
Em algum lugar.

Tudo que vai
Deixa o gosto, deixa as fotos
Quanto tempo faz
Deixa os dedos, deixa a memória
Eu nem me lembro mais

Fica o gosto, ficam as fotos
Quanto tempo faz
Ficam os dedos, fica a memória
Eu nem me lembro mais

Quanto tempo, eu já nem sei mais o que é meu
Nem quando, nem onde...

by Capital Inicial



quinta-feira, 11 de outubro de 2018

ENQUANTO EXISTO


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Há algo que jamais se esclareceu
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei

Lá mesmo esqueci que o destino
Sempre me quis só
no deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar”



by Adriana Calcanhoto



                Tenho uma querida amiga que diz, que ao termos certa idade adulta começam as dores, e sempre saberemos que estamos vivos, basta logo ao acordar, sentir uma dor, este é o sinal...sempre ríamos quando falávamos disso. Hoje entendo bem esta piadinha real. A dor prova que existo, logo penso ? Dane-se Descartes, apenas existimos e deixamos de existir, claro, todos temos uma existência, um tempo para ser vivido, antes da inexistência. Existo, penso e logo inexisto. “Lá mesmo esqueci que o destino Sempre me quis só...” No meu tempo de vida, que ainda gozo, sempre tive amigos sinceros e de coração, mas sempre estive só, ou melhor, ficava só, partindo para minha vida, assim como este amigo parte para a sua. A solidão foi se tornando inevitável e parte de minha vida. Mas não via com bons olhos, até alguém me dizer o que represento no Tarot, ou, que sou representado pela carta de número 9 do Tarot. Esta carta simboliza recolhimento, meditação, autoconhecimento, iluminação, concentração, prudência, isolamento e reavaliação. Sei que estou mais para isolamento e reavaliação, do que os outros predicados. O fato é que acalmou meu coração partido, costurado, remendado e quase cicatrizado nestes longos anos que estou vivendo, e mesmo só, adorando. “Não quero mais a morte, tenho muito que viver, vou querer amar de novo e se não der não vou sofrer”, sussurra em meus ouvidos esta linda melodia, Milton Nascimento. Tenho saudade daquele tempo das amizades juvenis, brincadeiras, risos, confidências, segredos e liberdade, muita liberdade. Escolhi meu caminho e segui, por vezes só, por vezes acompanhado, e novamente só, até os dias de hoje. Busco meu melhor no meu interior, lidar com o próximo, meu maior desafio, que venho melhorando com o passar dos anos, é uma questão profissional e de sobrevivência, pois precisamos todos, de dinheiro para viver com um mínimo de dignidade...o que não ocorre neste país chamado Brasil, cuja maioria da população é pobre em contraponto a uma minoria que tem tudo. Por isso meu casulo, o mesmo de Emily Dickinson, que serve de morada e transformação, refugio e liberdade das asas, para partir ou seguir seu caminho só. Como estou hoje, ainda com esperanças de um amanhã feliz, embora meu tempo já seja tão pouco, enquanto existo.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

ME TRAZER À TONA

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Caleidoscópio




Não é preciso apagar a luz
Eu fecho os olhos e tudo vem
Num caleidoscópio sem lógica

Eu quase posso ouvir a tua voz
Eu sinto a tua mão a me guiar
Pela noite a caminho de casa

Quem vai pagar as contas deste amor pagão
Te dar a mão, me trazer à tona prá respirar
Quem vai chamar meu nome
Ou te escutar

Me pedindo prá apagar a luz
Amanheceu, é hora de dormir
Nesse nosso relógio sem órbita

Se tudo tem que terminar assim
Que pelo menos seja até o fim
Prá gente não ter nunca mais que terminar

by Paralamas do Sucesso