...GQ Brasil: O fato de hoje olhar o Brasil de longe modificou o seu olhar sobre o país? Tomar distância ajudou a compreender melhor o que estamos passando?
Jean Wyllys: Eu vi as duas faces desse país. Somos um povo alegre, cordial, feliz, temos uma resistência impressionante, fazemos baticum do batente, temos uma música vigorosa que não encontra paralelo no mundo... Nós somos isso. Mas existe uma face de nós que estava recalcada. Que nação é essa que se incomoda com o fato de que as famílias pobres recebam 70 reais por mês através do Bolsa Família, que chama de bolsa-vagabundo um valor que tanta gente gasta numa única noite num bar? Que nação é essa que não reconhece a vulnerabilidade da população preta moradora das periferias, que não reconhece que a justiça brasileira tem lado, que não vê que a população carcerária é em sua maior parte preta e pobre? Todo o processo de redemocratização do país nos governos FHC e principalmente nos governos Lula interpelaram o que temos de melhor em nós. Botamos para fora aquilo que faz com que o mundo goste da gente. Nós mesmos nos víamos como pessoas bacanas. A economia indo bem, a gente partindo para o quase pleno emprego, luz para todos, ingresso na universidade geraram uma onda de felicidade. Venci o BBB em 2005 muito nessa onda de felicidade. O país estava feliz e logo estava aberto à diversidade. Naquele tempo foi possível eleger um nordestino gay, professor.
Jean Wyllys: Eu vi as duas faces desse país. Somos um povo alegre, cordial, feliz, temos uma resistência impressionante, fazemos baticum do batente, temos uma música vigorosa que não encontra paralelo no mundo... Nós somos isso. Mas existe uma face de nós que estava recalcada. Que nação é essa que se incomoda com o fato de que as famílias pobres recebam 70 reais por mês através do Bolsa Família, que chama de bolsa-vagabundo um valor que tanta gente gasta numa única noite num bar? Que nação é essa que não reconhece a vulnerabilidade da população preta moradora das periferias, que não reconhece que a justiça brasileira tem lado, que não vê que a população carcerária é em sua maior parte preta e pobre? Todo o processo de redemocratização do país nos governos FHC e principalmente nos governos Lula interpelaram o que temos de melhor em nós. Botamos para fora aquilo que faz com que o mundo goste da gente. Nós mesmos nos víamos como pessoas bacanas. A economia indo bem, a gente partindo para o quase pleno emprego, luz para todos, ingresso na universidade geraram uma onda de felicidade. Venci o BBB em 2005 muito nessa onda de felicidade. O país estava feliz e logo estava aberto à diversidade. Naquele tempo foi possível eleger um nordestino gay, professor.
GQ Brasil: A onda conservadora coincide com a crise econômica...
Jean Wyllys: Quando veio a crise econômica em 2013, tudo o que estava recalcado veio à tona. Nosso racismo, nossos 350 anos de escravidão, nosso machismo católico, intolerante... Todo o freio foi retirado. A metáfora é Brumadinho. A barragem que se rompe e engole a cidade com rejeitos é a metáfora do que o brasileiro viveu dentro de si. O preconceito que estava represado explodiu tomando conta de tudo, encontrando na figura do presidente um catalisador. Eu não me reconheço nessa nação, mas também não vou negar que essa nação existe e que ela ganhou as eleições. Ganhou com mentiras, mas ganhou.
Jean Wyllys: Quando veio a crise econômica em 2013, tudo o que estava recalcado veio à tona. Nosso racismo, nossos 350 anos de escravidão, nosso machismo católico, intolerante... Todo o freio foi retirado. A metáfora é Brumadinho. A barragem que se rompe e engole a cidade com rejeitos é a metáfora do que o brasileiro viveu dentro de si. O preconceito que estava represado explodiu tomando conta de tudo, encontrando na figura do presidente um catalisador. Eu não me reconheço nessa nação, mas também não vou negar que essa nação existe e que ela ganhou as eleições. Ganhou com mentiras, mas ganhou.