terça-feira, 30 de janeiro de 2018

AS GUERRAS, AS FOMES

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Os Ombros Suportam o Mundo


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

 by Carlos Drummond de Andrade
 

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

ESPERANÇA E SONHO

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"Para viver de verdade, pensando e repensando a existência, para que ela valha a pena, é preciso ser amado; e amar; e amar-se. Ter esperança; qualquer esperança.
Questionar o que nos é imposto, sem rebeldias insensatas mas sem demasiada sensatez. Saborear o bom, mas aqui e ali enfrentar o ruim. Suportar sem se submeter, aceitar sem se humilhar, entregar-se sem renunciar a si mesmo e à possível dignidade.
Sonhar, porque se desistimos disso apaga-se a última claridade e nada mais valerá a apena. Escapar, na liberdade do pensamento, desse espírito de manada que trabalha obstinadamente para nos enquadrar, seja lá no que for.
E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que afinal se conseguiu fazer."

by Lya Luft

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

ALEGRIAS E TRISTEZAS



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Os dias de alegria, hoje não passa de passado, quando então ainda jovens corríamos pelos campos, asfaltos e estradas de chão que não levavam a lugar algum, mesmo cansados ríamos mais ao saber disso...os dias de alegria ficaram sobre as árvores, que eram nossas naves espaciais ou no pequeno lago que era nosso mundo submarino. Os dias de alegria se passaram há muito tempo, como uma luz no final do túnel, só que neste caso, era o começo do túnel que não tem mais fim. Os dias de alegria deram lugar a grande tristeza do mundo adulto. Se soubéssemos que seria assim, não teríamos crescido, seríamos como Peter Pan, o eterno menino voador na Terra do Nunca. Mas é implacável o amadurecimento, envelhecimento de nossos corpos, diante de nossos olhos no espelho. Único local que reflete a verdade do tempo sobre nós...espelho, espelho meu...a resposta será visual, basta olhar para o reflexo, e verás então que o tempo não perdoa, ele passa e nos repassa, sugando nossas energias, nossa juventude, nossa alegria, os dias de alegria da infância. As responsabilidades do mundo adulto nos chamou, nos fazendo esquecer o que sentíamos e desenvolvendo maneiras de sobreviver, secando o coração, que se torna pedra e frieza. Os dias de alegria não existem mais, assim como tua voz ao longe pelo telefone, me gritando que tudo acabou há muito tempo, e não sabia porque eu insisto em voltar a este assunto. Eu sabia, só precisava ouvir mais uma vez a voz que me ensinou o amor e logo a seguir o ódio...eram os dias de alegria de nossa juventude perdida, agora a grande tristeza de meu mundo velho e isolado de tudo, apenas sentado numa poltrona olhando a janela e esperando pelo fim da grande tristeza, já que os dias de alegria não existem mais...

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

VAI FICANDO NO CAMINHO

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POEMA

Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo
E procurei no escuro
Alguém com seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via um infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim (que não tem fim)

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

by Cazuza

ps.Uma interpretação divina do Ney Matogrosso, é uma linda canção, e um poema que me faz refletir, o que eu estou deixando pelo caminho ? coisas boas ? coisas ruins ? amigos ? Continua a dúvida, mas enquanto isso quero mais poemas, mais música, mais riso e felicidade. : )  

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

DOLORES FOREVER


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The Cranberries

Salvation

To all those people doing lines, don't do it, don't do it
Inject your soul with liberty, it's free, it's free

To all the kids with heroin eyes, don't do it, don't do it
Because it's not, not what it seems
No, no it's not, not what it seems

Salvation, salvation, salvation is free
Salvation, salvation, salvation is free
To all those parents with sleepless nights (sleepless nights)
Tie your kids on to their beds, clean their heads

To all the kids with heroin eyes, don't do it, don't do it
Because it's not, not what it seems
No, no it's not, not what it seems

Salvation, salvation, salvation is free
Salvation, salvation, salvation is free
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Dolores O'Riordan


Salvação

Para todas as pessoas fazendo carreirinhas, não façam, não façam
Injete liberdade em sua alma, é grátis, é grátis

Para todas as crianças com olhos de heroína, não façam, não façam
Porque não é não é o que parece
Não, não, não é não é o que parece

Salvação, salvação, salvação é de graça
Salvação, salvação, salvação é de graça
Para todos aqueles pais com noites insônes, noites insônes
Amarre seus filhos em casa em suas camas, limpem suas cabeças

Para todas as crianças com olhos de heroína, não façam, não façam
Porque não é não é o que parece
Não, não, não é não é o que parece

Salvação, salvação, salvação é de graça
Salvação, salvação, salvação é de graça





ps. Morreu a vocalista dos Cranberries, que eu gosto tanto...






quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

QUERO SER SÓZINHO

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Lisbon Revisited (1923)

NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

PARA SEMPRE CAIO FERNANDO ABREU

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DIÁLOGO








A: Você é meu companheiro.
B: Hein?
A: Você é meu companheiro, eu disse.
B: O quê?
A: Eu disse que você é meu companheiro.
B: O que é que você quer dizer com isso?
A: Eu quero dizer que você é meu companheiro. Só isso.
B: Tem alguma coisa atrás, eu sinto.
A: Não. Não tem nada. Deixa de ser paranóico.
B: Não é disso que estou falando.
A: Você está falando do quê, então?
B: Eu estou falando disso que você falou agora.
A: Ah, sei. Que eu sou teu companheiro.
B: Não, não foi assim: que eu sou teu companheiro.
A: Você também sente?
B: O quê?
A: Que você é meu companheiro?
B: Não me confunda. Tem alguma coisa atrás, eu sei.
A: Atrás do companheiro?
B: É.
A: Não.
B: Você não sente?
A: Que você é meu companheiro? Sinto, sim. Claro que eu sinto. E você, não?
B: Não. Não é isso. Não é assim.
A: Você não quer que seja isso assim?
B: Não é que eu não queira: é que não é.
A: Não me confunda, por favor, não me confunda. No começo era claro.
B: Agora não?
A: Agora sim. Você quer?
B: O quê?
A: Ser meu companheiro.
B: Ser teu companheiro?
A: É.
B: Companheiro?
A: Sim.
B: Eu não sei. Por favor, não me confunda. No começo era claro Tem alguma coisa atrás, você não vê ? 
A: Eu vejo. Eu quero.
B: O quê?
A: Que você seja meu companheiro.
B: Hein?
A: Eu quero que você seja meu companheiro, eu disse.
B: O quê?
A: Eu disse que eu quero que você seja meu companheiro.
B: Você disse?
A: Eu disse?
B: Não. Não foi assim: eu disse.
A: O quê?
B: Você é meu companheiro.
A: Hein?
(ad infinitum)
Caio Fernando Abreu in Morangos Mofados

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

PASSAGEM



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Eu não sou da sua rua,
Eu não sou o seu vizinho,
Eu moro muito longe, sozinho.

Estou aqui de passagem.

Eu não sou da sua rua,
Eu não falo a sua língua,
Minha vida é diferente da sua.

Estou aqui de passagem.

Esse mundo não é meu,
Esse mundo não é seu.
 
by Arnaldo Antunes / Branco Mello


segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

MEU CORAÇÃO BATE, BATE, BATE...


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Introspectojair, este ser em plena crise dos 50 anos…

A introspecção foi o resultado da personagem com base em Stanislavski, criado por mim para sobreviver aos olhares e toscos comentários. Consegui. Consegui também me isolar, o que estava implícito quando deixe de responder quando batiam em minha porta. Aos poucos as batidas foram desaparecendo...consegui, cheguei a pensar, consegui estar só, sem compromissos ou obrigações, apenas estar só, e meu blog pagou o pato, ele foi o primeiro que abandonei, talvez por falta do que escrever, talvez minha psiquê precisasse viver um pouco fora da redoma de vidro da blogosfera. Abri mão de compartilhar os textos e poemas e quadros e fotografias e logo ninguém mais quis saber deste blog...colhemos o que plantamos. Na primeira colheita percebi quanta solidão provocada por mim mesmo (autoflagelo?). Senti falta e precisei de carinho e amizade, mas tarde demais, as pessoas não estão a nossa disposição. Então fui para o facebook, que nunca simpatizei, mas vencido pela solidão, precisei encontrar amigos perdidos no tempo de minha vida. Grata surpresa, encontrei pessoas que se alegravam com minha existência...embora pareça muito artificial, e é, o facebook faz um ótimo trabalho de encontrar pessoas que perdemos no andar de nossas vidas. Meu blog é minha terapia, não espero nada de meus escritos, a não ser me libertar destas palavras, geralmente amargas, que brotam de mim e o blog as purifica e me faz refletir. Jung já me dizia, existe o tempo de viver, e se precisar, tem o tempo da terapia. O mundo anda tão violento e triste, que preciso me recolher para me fortalecer e continuar insistindo em viver, mesmo o mundo estando de pernas para o ar, ameaças de bombas super atômicas para serem jogas de um lado a outro do planeta, a fome, ela continua matando, não só na negra África, no mundo, o desemprego, uma geração completamente perdida e sem esperanças...não sou Drummond e não carregarei o mundo nas costas, então me retiro, em silêncio e só, até chegar este momento em que retomo os escritos aqui no meu bloguinho. Continuo silencioso e um leve desespero em meu coração que bate, bate, bate...


quinta-feira, 4 de janeiro de 2018